|
CARTA
DEMOCRÁTICA INTERAMERICANA (Aprovada
na primeira sessão plenária, realizada em
A ASSEMBLÉIA GERAL,
CONSIDERANDO que a Carta da Organização dos Estados Americanos
reconhece que a democracia representativa é indispensável para a
estabilidade, a paz e o desenvolvimento da região, e que um dos propósitos
da OEA é promover e consolidar a democracia representativa, respeitado o
princípio da não-intervenção;
RECONHECENDO as contribuições da OEA e de outros mecanismos
regionais e sub-regionais para a promoção e consolidação da democracia
nas Américas;
RECORDANDO que os Chefes de Estado e de Governo das Américas,
reunidos na Terceira Cúpula das Américas, realizada de 20 a 22 de abril
de 2001 na Cidade de Québec, adotaram uma cláusula democrática que
estabelece que qualquer alteração ou ruptura inconstitucional da ordem
democrática em um Estado do Hemisfério constitui um obstáculo insuperável
à participação do Governo do referido Estado no processo de Cúpulas
das Américas;
LEVANDO EM CONTA que as cláusulas democráticas existentes nos
mecanismos regionais e sub-regionais expressam os mesmos objetivos que a
cláusula democrática adotada pelos Chefes de Estado e de Governo na
Cidade de Québec;
REAFIRMANDO que o caráter participativo da democracia em nossos países
nos diferentes âmbitos da atividade pública contribui para a consolidação
dos valores democráticos e para a liberdade e a solidariedade no Hemisfério;
CONSIDERANDO que a solidariedade e a cooperação dos Estados
americanos requerem a sua organização política com base no exercício
efetivo da democracia representativa e que o crescimento econômico e o
desenvolvimento social baseados na justiça e na eqüidade e a democracia
são interdependentes e se reforçam mutuamente;
REAFIRMANDO que a luta contra a pobreza, especialmente a eliminação
da pobreza crítica, é essencial para a promoção e consolidação da
democracia e constitui uma responsabilidade comum e compartilhada dos
Estados americanos;
TENDO PRESENTE que a Declaração Americana dos Direitos e Deveres
do Homem e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos contêm os
valores e princípios de liberdade, igualdade e justiça social que são
intrínsecos à democracia;
REAFIRMANDO que a promoção e proteção dos direitos humanos é
condição fundamental para a existência de uma sociedade democrática e
reconhecendo a importância que tem o contínuo desenvolvimento e
fortalecimento do sistema interamericano de direitos humanos para a
consolidação da democracia;
CONSIDERANDO que a educação é um meio eficaz para fomentar a
consciência dos cidadãos com respeito a seus próprios países e, desta
forma, lograr uma participação significativa no processo de tomada de
decisões, e reafirmando a importância do desenvolvimento dos recursos
humanos para se alcançar um sistema democrático sólido;
RECONHECENDO que um meio ambiente saudável é indispensável para
o desenvolvimento integral do ser humano, o que contribui para a
democracia e a estabilidade política;
TENDO PRESENTE que o Protocolo de San Salvador em matéria de
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais ressalta a importância de que
tais direitos sejam reafirmados, desenvolvidos, aperfeiçoados e
protegidos para consolidar o sistema democrático representativo de
governo;
RECONHECENDO que o direito dos trabalhadores de se associarem
livremente para a defesa e promoção de seus interesses é fundamental
para a plena realização dos ideais democráticos;
LEVANDO EM CONTA que, no Compromisso de Santiago com a Democracia e
a Renovação do Sistema Interamericano, os Ministros das Relações
Exteriores expressaram sua determinação de adotar um conjunto de
procedimentos eficazes, oportunos e expeditos para assegurar a promoção
e defesa da democracia representativa, respeitado o princípio da não-intervenção,
e que a resolução AG/RES. 1080 (XXI-O/91) estabeleceu, conseqüentemente,
um mecanismo de ação coletiva para o caso em que ocorresse uma interrupção
abrupta ou irregular do processo político institucional democrático ou
do legítimo exercício do poder por um governo democraticamente eleito em
qualquer dos Estados membros da Organização, materializando, assim, uma
antiga aspiração do Continente de responder rápida e coletivamente em
defesa da democracia;
RECORDANDO que, na Declaração de Nassau [AG/DEC. 1 (XXII-O/92)],
acordou-se desenvolver mecanismos a fim de proporcionar a assistência que
os Estados membros solicitem para promover, preservar e fortalecer a
democracia representativa, de maneira a complementar e cumprir o previsto
na resolução AG/RES. 1080 (XXI-O/91);
TENDO PRESENTE que, na Declaração de Manágua para a Promoção
da Democracia e do Desenvolvimento [AG/DEC. 4 (XXIII-O/93)], os Estados
membros expressaram seu convencimento de que a democracia, a paz e o
desenvolvimento são partes inseparáveis e indivisíveis de uma visão
renovada e integral da solidariedade americana e de que, da implementação
de uma estratégia inspirada na interdependência e na complementaridade
desses valores, dependerá a capacidade da OEA de contribuir para
preservar e fortalecer as estruturas democráticas no Hemisfério;
CONSIDERANDO que, na Declaração de Manágua para a Promoção da
Democracia e do Desenvolvimento, os Estados membros expressaram sua convicção
de que a missão da Organização não se limita à defesa da democracia
nos casos de rompimento de seus valores e princípios fundamentais, mas
também exige um trabalho permanente e criativo destinado a consolidá-la,
bem como um esforço permanente para prevenir e antecipar as próprias
causas dos problemas que afetam o sistema democrático de governo;
TENDO PRESENTE que os Ministros das Relações Exteriores das Américas,
por ocasião do Trigésimo Primeiro Período Ordinário de Sessões da
Assembléia Geral em São José, Costa Rica, dando cumprimento à expressa
instrução dos Chefes de Estado e Governo reunidos na Terceira Cúpula
das Américas, realizada na Cidade de Québec, aceitaram o documento de
base da Carta Democrática Interamericana e encarregaram o Conselho
Permanente de fortalecê-la e ampliá-la, em conformidade com a Carta da
OEA, para sua aprovação definitiva em um período extraordinário de
sessões da Assembléia Geral em Lima, Peru;
RECONHECENDO que todos os direitos e obrigações dos Estados
membros nos termos da Carta da OEA representam o fundamento sobre o qual
estão constituídos os princípios democráticos do Hemisfério; e
LEVANDO EM CONTA o desenvolvimento progressivo do Direito
Internacional e a conveniência de precisar as disposições contidas na
Carta da Organização dos Estados Americanos e em instrumentos básicos
concordantes, relativas à preservação e defesa das instituições
democráticas, em conformidade com a prática estabelecida, RESOLVE:
Aprovar a seguinte CARTA
DEMOCRÁTICA INTERAMERICANA I A
democracia e o sistema interamericano Artigo 1
Os povos da América têm direito à democracia e seus governos têm
a obrigação de promovê-la e defendê-la.
A democracia é essencial para o desenvolvimento social, político
e econômico dos povos das Américas. Artigo 2
O exercício efetivo da democracia representativa é a base do
Estado de Direito e dos regimes constitucionais dos Estados membros da
Organização dos Estados Americanos.
A democracia representativa reforça-se e aprofunda-se com a
participação permanente, ética e responsável dos cidadãos em um marco
de legalidade, em conformidade com a respectiva ordem constitucional. Artigo 3
São elementos essenciais da democracia representativa, entre
outros, o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais, o
acesso ao poder e seu exercício com sujeição ao Estado de Direito, a
celebração de eleições periódicas, livres, justas e baseadas no sufrágio
universal e secreto como expressão da soberania do povo, o regime
pluralista de partidos e organizações políticas, e a separação e
independência dos poderes públicos. Artigo 4
São componentes fundamentais do exercício da democracia a
transparência das atividades governamentais, a probidade, a
responsabilidade dos governos na gestão pública, o respeito dos direitos
sociais e a liberdade de expressão e de imprensa.
A subordinação constitucional de todas as instituições do
Estado à autoridade civil legalmente constituída e o respeito ao Estado
de Direito por todas as instituições e setores da sociedade são
igualmente fundamentais para a democracia. Artigo 5
O fortalecimento dos partidos e de outras organizações políticas
é prioritário para a democracia. Dispensar-se-á
atenção especial à problemática derivada dos altos custos das
campanhas eleitorais e ao estabelecimento de um regime equilibrado e
transparente de financiamento de suas atividades. Artigo 6
A participação dos cidadãos nas decisões relativas a seu próprio
desenvolvimento é um direito e uma responsabilidade.
É também uma condição necessária para o exercício pleno e
efetivo da democracia. Promover
e fomentar diversas formas de participação fortalece a democracia. II A
democracia e os direitos humanos Artigo 7
A democracia é indispensável para o exercício efetivo das
liberdades fundamentais e dos direitos humanos, em seu caráter universal,
indivisível e interdependente, consagrados nas respectivas constituições
dos Estados e nos instrumentos interamericanos e internacionais de
direitos humanos. Artigo 8
Qualquer pessoa ou grupo de pessoas que considere que seus direitos
humanos tenham sido violados pode interpor denúncias ou petições
perante o sistema interamericano de promoção e proteção dos direitos
humanos, conforme os procedimentos nele estabelecidos.
Os Estados membros reafirmam sua intenção de fortalecer o sistema
interamericano de proteção dos direitos humanos, para a consolidação
da democracia no Hemisfério. Artigo 9
A eliminação de toda forma de discriminação, especialmente a
discriminação de gênero, étnica e racial, e das diversas formas de
intolerância, bem como a promoção e proteção dos direitos humanos dos
povos indígenas e dos migrantes, e o respeito à diversidade étnica,
cultural e religiosa nas Américas contribuem para o fortalecimento da
democracia e a participação do cidadão. Artigo 10
A promoção e o fortalecimento da democracia requerem o exercício
pleno e eficaz dos direitos dos trabalhadores e a aplicação de normas
trabalhistas básicas, tal como estão consagradas na Declaração da
Organização Internacional do Trabalho (OIT) relativa aos Princípios e
Direitos Fundamentais no Trabalho e seu Acompanhamento, adotada em 1998,
bem como em outras convenções básicas afins da OIT.
A democracia fortalece-se com a melhoria das condições de
trabalho e da qualidade de vida dos trabalhadores do Hemisfério. III Democracia,
desenvolvimento integral e combate à pobreza Artigo 11
A democracia e o desenvolvimento econômico e social são
interdependentes e reforçam-se mutuamente. Artigo 12
A pobreza, o analfabetismo e os baixos níveis de desenvolvimento
humano são fatores que incidem negativamente na consolidação da
democracia. Os Estados
membros da OEA se comprometem a adotar e executar todas as ações necessárias
para a criação de emprego produtivo, a redução da pobreza e a erradicação
da pobreza extrema, levando em conta as diferentes realidades e condições
econômicas dos países do Hemisfério.
Este compromisso comum frente aos problemas do desenvolvimento e da
pobreza também ressalta a importância de manter os equilíbrios
macroeconômicos e o imperativo de fortalecer a coesão social e a
democracia. Artigo 13
A promoção e observância dos direitos econômicos, sociais e
culturais são inerentes ao desenvolvimento integral, ao crescimento econômico
com eqüidade e à consolidação da democracia dos Estados do Hemisfério. Artigo 14
Os Estados acordam examinar periodicamente as ações adotadas e
executadas pela Organização destinadas a fomentar o diálogo, a cooperação
para o desenvolvimento integral e o combate à pobreza no Hemisfério, e
tomar as medidas oportunas para promover esses objetivos. Artigo 15
O exercício da democracia facilita a preservação e o manejo
adequado do meio ambiente. É
essencial que os Estados do Hemisfério implementem políticas e estratégias
de proteção do meio ambiente, respeitando os diversos tratados e convenções,
para alcançar um desenvolvimento sustentável em benefício das futuras
gerações. Artigo 16
A educação é chave para fortalecer as instituições democráticas,
promover o desenvolvimento do potencial humano e o alívio da pobreza, e
fomentar um maior entendimento entre os povos.
Para alcançar essas metas, é essencial que uma educação de
qualidade esteja ao alcance de todos, incluindo as meninas e as mulheres,
os habitantes das zonas rurais e as minorias. IV Fortalecimento
e preservação da institucionalidade democrática Artigo 17
Quando o governo de um Estado membro considerar que seu processo
político institucional democrático ou seu legítimo exercício do poder
está em risco poderá recorrer ao Secretário-Geral ou ao Conselho
Permanente, a fim de solicitar assistência para o fortalecimento e
preservação da institucionalidade democrática. Artigo
18
Quando, em um Estado membro, ocorrerem situações que possam
afetar o desenvolvimento do processo político institucional democrático
ou o legítimo exercício do poder, o Secretário-Geral ou o Conselho
Permanente poderão, com o consentimento prévio do governo afetado,
determinar visitas e outras gestões com a finalidade de fazer uma análise
da situação. O Secretário-Geral
encaminhará um relatório ao Conselho Permanente, o qual realizará uma
avaliação coletiva da situação e, caso seja necessário, poderá
adotar decisões destinadas à preservação da institucionalidade democrática
e seu fortalecimento. Artigo 19
Com base nos princípios da Carta da OEA, e sujeito às suas normas,
e em concordância com a cláusula democrática contida na Declaração da
Cidade de Québec, a ruptura da ordem democrática ou uma alteração da
ordem constitucional que afete gravemente a ordem democrática num Estado
membro constitui, enquanto persista, um obstáculo insuperável à
participação de seu governo nas sessões da Assembléia Geral, da Reunião
de Consulta, dos Conselhos da Organização e das conferências
especializadas, das comissões, grupos de trabalho e demais órgãos
estabelecidos na OEA. Artigo 20
Caso num Estado membro ocorra uma alteração da ordem
constitucional que afete gravemente sua ordem democrática, qualquer
Estado membro ou o Secretário-Geral poderá solicitar a convocação
imediata do Conselho Permanente para realizar uma avaliação coletiva da
situação e adotar as decisões que julgar convenientes.
O Conselho Permanente, segundo a situação, poderá determinar a
realização das gestões diplomáticas necessárias, incluindo os bons ofícios,
para promover a normalização da institucionalidade democrática.
Se as gestões diplomáticas se revelarem infrutíferas ou a urgência
da situação aconselhar, o Conselho Permanente convocará imediatamente
um período extraordinário de sessões da Assembléia Geral para que esta
adote as decisões que julgar apropriadas, incluindo gestões diplomáticas,
em conformidade com a Carta da Organização, o Direito Internacional e as
disposições desta Carta Democrática.
No processo, serão realizadas as gestões diplomáticas necessárias,
incluindo os bons ofícios, para promover a normalização da
institucionalidade democrática. Artigo 21
Quando a Assembléia Geral, convocada para um período extraordinário de sessões, constatar que
ocorreu a ruptura da ordem democrática num Estado membro e que as gestões
diplomáticas tenham sido infrutíferas, em conformidade com a Carta da
OEA tomará a decisão de suspender o referido Estado membro do exercício de seu direito de participação na OEA mediante
o voto afirmativo de dois terços dos Estados membros.
A
suspensão entrará em vigor imediatamente.
O Estado membro que tiver sido objeto de suspensão
deverá continuar observando o cumprimento de suas obrigações como
membro da Organização, em particular em matéria de direitos humanos.
Adotada a decisão de suspender um governo, a Organização manterá
suas gestões diplomáticas para o restabelecimento da democracia no
Estado membro afetado. Artigo 22
Uma vez superada a decisão que motivou a suspensão, qualquer
Estado membro ou o Secretário-Geral poderá propor à Assembléia Geral o
levantamento da suspensão. Esta
decisão será adotada pelo voto de dois terços dos Estados membros, de
acordo com a Carta da OEA. V A
democracia e as missões de observação eleitoral Artigo 23
Os Estados membros são os responsáveis pela organização,
realização e garantia de processos eleitorais livres e justos.
Os Estados membros, no exercício de sua soberania, poderão
solicitar à OEA assessoria ou assistência para o fortalecimento e o
desenvolvimento de suas instituições e seus processos eleitorais,
inclusive o envio de missões preliminares com esse propósito. Artigo 24
As missões de observação eleitoral serão levadas a cabo a
pedido do Estado membro interessado.
Com essa finalidade, o governo do referido Estado e o Secretário-Geral
celebrarão um convênio que determine o alcance e a cobertura da missão
de observação eleitoral de que se tratar.
O Estado membro deverá garantir as condições de segurança,
livre acesso à informação e ampla cooperação com a missão de observação
eleitoral.
As missões de observação eleitoral realizar-se-ão em
conformidade com os princípios e normas da OEA.
A Organização deverá assegurar a eficácia e independência
dessas missões, para o que as dotará dos recursos necessários. Elas serão realizadas de forma objetiva, imparcial e
transparente, e com a devida capacidade técnica.
As missões de observação eleitoral apresentarão oportunamente
ao Conselho Permanente, por meio da Secretaria-Geral, os relatórios sobre
suas atividades. Artigo 25
As missões de observação eleitoral deverão informar o Conselho
Permanente, por meio da Secretaria-Geral, caso não existam as condições
necessárias para a realização de eleições livres e justas.
A OEA poderá enviar, com o acordo do Estado interessado, missões
especiais a fim de contribuir para criar ou melhorar as referidas condições. VI Promoção
da cultura democrática Artigo 26
A OEA continuará desenvolvendo programas e atividades dirigidos à
promoção dos princípios e práticas democráticos e ao fortalecimento
da cultura democrática no Hemisfério, considerando que a democracia é
um sistema de vida fundado na liberdade e na melhoria econômica, social e
cultural dos povos. A OEA
manterá consultas e cooperação contínua com os Estados membros,
levando em conta as contribuições de organizações da sociedade civil
que trabalhem nesses campos. Artigo 27
Os programas e as atividades terão por objetivo promover a
governabilidade, a boa gestão, os valores democráticos e o
fortalecimento das instituições políticas e das organizações da
sociedade civil. Dispensar-se-á atenção especial ao desenvolvimento de
programas e atividades orientados para a educação da infância e da
juventude como meio de assegurar a continuidade dos valores democráticos,
inclusive a liberdade e a justiça social. Artigo 28
AGE00011P03
|