CONSELHO
PERMANENTE DA ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS
GT/CDI-2/01 add. 4
31 julho 2001
Original: francês
Grupo de Trabalho Encarregado de Estudar o Projeto de
Carta Democrática Interamericana
COMENTÁRIOS
E PROPOSTAS DOS ESTADOS MEMBROS
AO
PROJETO DE CARTA DEMOCRÁTICA INTERAMERICANA
Haiti
MISSÃO PERMANENTE DO HAITI
JUNTO À ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS
Senhor
Embaixador:
Em resposta à carta de Vossa Excelência de 27 de julho de
2001, tenho a honra de comunicar-lhe as observações preliminares,
abaixo indicadas, sobre o projeto de Carta Democrática Interamericana
(rev. 7). Foi solicitada
a opinião dos setores estaduais competentes, bem como a de certas
organizações da sociedade civil e serão comunicados à Organização
comentários consolidados após a resposta dos referidos setores e
organizações.
A versão atual do projeto não resolve a fundo os problemas
apresentados pela identificação e delimitação precisa dos casos,
pelos procedimentos e medidas previstos no caso de atentados contra a
ordem democrática, de um lado, e do tratamento reservado à questão
fundamental da pobreza, do outro.
1.
A especificação dos casos – procedimentos e medidas
previstos
Tratadas basicamente nos artigos 12 a 16 – especialmente nos
artigos 12, 13 e 14 – essas questões continuam ainda mais confusas.
O artigo 12 refere-se à aplicação da “cláusula democrática”
adotada na Terceira Cúpula das Américas.
Aciona sanções automáticas no caso de “mudança
inconstitucional ou ruptura” da ordem democrática num Estado da
região. Entretanto, como
não se define o fato incriminado com precisão suficiente para torná-lo
automaticamente reconhecível, pareceria indispensável o recurso a um
mecanismo coletivo de avaliação. Com outras palavras, o artigo é totalmente omisso a respeito
deste ponto crucial.
Por outro lado, o artigo levanta necessariamente a questão de
saber se a OEA existe ainda como instituição autônoma (e, neste
caso, parceira do processo da Cúpula) ou se transformou (e por que
via normativa) simplesmente numa peça da maquinaria do processo da Cúpula.
Neste último caso, uma tal mudança não necessitaria
obrigatoriamente uma emenda, em boa e devida forma, da Carta da
Organização?
Por sua vez, o artigo 13 identifica, em princípio, um outro
tipo de atentado, definido como “interrupção abrupta ou irregular
do processo político institucional democrático ou do legítimo exercício
do poder de um governo democrático.”
Promove um procedimento que parece referir-se ao artigo
seguinte. Contudo, não
se pode ter certeza porque este último artigo, o 14, se refere a uma
“interrupção inconstitucional”, expressão encontra no artigo
12. Ou este artigo
pareceria tratar de outro caso. Resulta
daí uma situação de confusão.
Além disso, a medida suspensiva prevista no artigo 12 é
enumerativa, ao passo que a mantida no artigo 15 é apresentada de
forma global, sem enumeração dos órgãos de cujas atividades o
Estado culpado não poderia participar.
As duas medidas seriam qualitativamente diferentes ou se
refeririam à mesma realidade? Ou
ainda, a enumeração significaria que a sanção é menos severa?
Se se tratar de dois casos diferentes de atentado contra a
democracia, seria necessário precisar em termos inequívocos e
determinar claramente os mecanismos e procedimentos aplicáveis.
Ao contrário, se se tratar de atos justificáveis de medidas
idênticas, seria necessário demonstrá-lo pelo uso inequívoco de
expressões qualitativas e adoção de medidas nos mesmos termos.
Enfim, convém ressaltar que as partes da frase acrescentadas
no final do artigo 12 aumentam ainda mais a confusão.
Primeiro, a expressão “sujeito ao estabelecido na Carta da
OEA” tem por efeito abrir a possibilidade de anular disposições
enunciadas no artigo. Portanto,
para que serviria adotar uma Carta Democrática no âmbito da Organização
dos Estados Americanos se de início não é certa a sua
compatibilidade com o ato constitutivo da Organização?
Segundo, a expressão entre colchetes [bem como do processo de
Cúpulas das Américas] levanta, por um lado, a questão de saber se a
OEA pode tomar disposições em nome da Cúpula das Américas e, por
outro, se as decisões no âmbito da OEA podem ser tomadas com reserva
das disposições do processo da Cúpula das Américas.
2.
O lugar do problema da pobreza no projeto de Carta Democrática
Interamericana
Conforme acima indicado, o projeto de Carta Democrática
Interamericana não esclarece o lugar que atribui ao problema crucial
da pobreza em sua relação de interdependência com a democracia
concebida numa perspectiva de viabilidade.
O objetivo das Américas não é somente estabelecer a
democracia, mas sobretudo estabelecer uma democracia sustentável. E
não se pode estabelecer uma democracia
sustentável sem dar uma resposta séria ao drama da pobreza que
é, ao mesmo tempo, uma questão moral, socioeconômica e política.
Considerando que a Carta retoma a cláusula democrática
constante da Declaração de Québec e tira as conseqüências para a
Organização dos Estados Americanos, conviria inspirar-se nesse mesmo
documento para equilibrar a Carta reforçando suas disposições
relativas à luta contra a pobreza?
De fato, essas disposições são, no mínimo, alusivas, de
modo que sua debilidade de conteúdo não produz nenhuma ação real. À “cláusula política”, chamada “cláusula democrática”
deve corresponder necessariamente uma “cláusula social”. Neste sentido, propõe-se a introdução dos dois artigos
sobre o assunto nos seguintes termos:
A:
A pobreza, o
analfabetismo e o baixo nível de desenvolvimento são fatores
estruturais que afetam negativamente a democracia e representam obstáculos
ao gozo dos direitos do homem tomados como um conjunto indivisível.
A sua erradicação é um objetivo compartilhado solidariamente
pelos Estados das Américas “unidos na sua determinação de legar
às futuras gerações um Hemisfério democrático e próspero, mais
justo e generoso, um Hemisfério onde a pessoa não seja negligenciada.”
B:
Os Estados das Américas
não pouparão os esforços individuais e coletivos para libertar os
cidadãos do Continente das condições desumanizadoras da pobreza
extrema. Estão novamente
empenhados em envidar os esforços necessários para alcançar, até
2015, os objetivos em matéria de desenvolvimento internacional,
sobretudo no tocante à redução de 50% da proporção de pessoas que
vivem em pobreza extrema.
O texto destes dois novos artigos poderia situar-se nas
proximidades do artigo 5 ou simplesmente segui-lo.
Além disso, cumpre notar os seguintes pontos:
Primeiro, o artigo 7 traz à tona o importante problema da relação
existente entre a democracia e os direitos do homem.
A este respeito, cumpre recordar que esta mesma questão foi
levantada no âmbito das Nações Unidas, cuja Comissão de Direitos
Humanos pediu recentemente ao Alto Comissariado para os Direitos do
Homem a criação de um grupo de trabalho constituído por peritos
para estudar o assunto e fazer recomendações.
Neste contexto, pareceria prematuro que a Organização dos
Estados Americanos se pronunciasse agora, de maneira categórica,
sobre o tema.
Segundo, o procedimento relativo ao levantamento da suspensão
prevista no artigo 16 deveria ser mais completo ou previsível.
Falta especialmente uma referência aos fatos que serviram de
apoio ou justificação à proposta de levantar uma suspensão. Para sanar essa ausência, seria necessário prever a criação
de uma comissão de avaliação interestatal, cujo relatório serviria
de base à proposta de suspender as medidas adotadas contra um Estado
membro.
Aproveito a oportunidade para renovar a Vossa Excelência os
protestos da minha alta estima e distinta consideração.
Jean Ricot Dorméus
Representante Permanente Ad
Interim
A
Sua Excelência o Senhor
Embaixador
Hernán R. Castro
Presidente
do Conselho Permanente
da Organização dos Estados Americanos
Washington,
D.C. 20006
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