Imprensa da CIDH
Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) apresentou o caso 12.964 perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) em 5 de julho de 2023. Este caso é relativo à responsabilidade internacional do Peru pela detenção, tortura e violação sexual de Georgina Gamboa García, uma mulher, adolescente, indígena quéchua de 17 anos, perpetrada pela polícia peruana em 1980, assim como pela falta de uma investigação adequada e sanções para os responsáveis.
Os fatos mencionados se enquadram em um contexto de violência sexual e tortura generalizada e sistemática contra mulheres durante o conflito armado no Peru na década de 80.
Em dezembro de 1980, Georgina Gamboa García e sua mãe se apresentaram voluntariamente perante a polícia de Vilcashuamán para testemunhar sobre fatos de delinquência que envolviam membros do Sendero Luminoso. Na estação policial lhes informaram que permaneceriam detidas até que o seu pai se apresentasse, o que ocorreu três dias depois. Posteriormente, em janeiro de 1981, membros da guarda civil ingressaram violentamente em sua casa e a detiveram novamente. Na noite da sua detenção, a levaram a um calabouço onde sete efetivos policiais a torturam e violaram em reiteradas ocasiões.
Os exames médicos confirmaram a violação e que Georgina estava grávida. Sua filha nasceu em outubro de 1981. Georgina denunciou em reiteradas ocasiões ter sido vítima de violência sexual e tortura, mesmo que tenha passado a receber ameaças de morte por isso.
As denúncias resultaram em uma investigação que foi arquivada provisoriamente pelo Ministério Público em janeiro de 1982, alegando que não se pôde identificar os responsáveis. Posteriormente, uma nova investigação foi iniciada e resultou na sentença de 10 de dezembro de 1985, na qual os agentes envolvidos foram absolvidos.
No Relatório de Mérito, a CIDH concluiu que os abusos sofridos por Georgina Gamboa García constituíram uma grave violação do direito à integridade pessoal e foram atos de tortura. Por outro lado, as prisões foram ilegais e arbitrárias, razão pela qual violaram o direito à liberdade pessoal. O relatório também considerou que Georgina deveria ter recebido medidas especiais de proteção pela sua condição de adolescente e não ser privada da sua liberdade por mais de 16 dias sem ser apresentada perante um juiz. Medida, aliás, que superou amplamente o prazo de detenção de 48 horas, estabelecido pela norma constitucional vigente no momento.
A Comissão identificou que o Estado não ofereceu assistência médica e psicológica a Georgina, sua filha e seus irmãos. Tampouco considerou as sequelas dos fatos traumáticos dos quais foram vítimas, nem a especial situação de vulnerabilidade de Georgina Gamboa por ser adolescente, e que junto à sua filha sofreram uma tripla discriminação, por serem mulheres, meninas indígenas, e viverem em uma situação de pobreza extrema.
Quanto ao processo judicial, a CIDH constatou que o primeiro processo penal foi concluído 4 anos depois dos fatos transcorridos, não respeitou as garantias judiciais da vítima e foi arquivado pela falta de diligência. Além disso, a sentença minimizou a violência sexual, exibindo estereótipos de gênero e socioculturais. Não foram realizadas entrevistas nem exames médicos e psicológicos adequados, e as pessoas profissionais de saúde que atenderam Georgina Gamboa García não informaram sobre os sinais de tortura e de violência sexual.
A Comissão também considerou que a decisão de arquivar a segunda investigação em 2011 carecia de justificativa e que a impunidade pelos fatos persiste até hoje, pelo que concluiu que o Estado descumpriu seu dever de devida diligência.
Por último, o Estado também é responsável pela violação do direito à integridade pessoal dos familiares de Georgina Gamboa García, devido aos graves danos emocionais e à estigmatização social que sofreram pelos fatos e pela situação de impunidade.
Em suma, a Comissão concluiu que o Estado é responsável pela violação dos direitos estabelecidos nos artigos 5 (integridade pessoal), 7 (liberdade pessoal), 8 (garantias judiciais), 11 (vida privada e familiar), 19 (direito à infância) e 25 (proteção judicial) da Convenção Americana, combinados com o artigo 1.1. do mesmo instrumento. Igualmente, pela violação das suas obrigações estabelecidas nos artigos 1, 6 e 8 da Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura; assim como no artigo 7 da Convenção de Belém do Pará, em prejuízo de Georgina Gamboa García e no artigo 5.1 dos seus familiares.
Assim, a Comissão recomendou ao Estado do Peru as seguintes medidas de reparação:
A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato deriva da Carta da OEA e da Convenção Americana de Direitos Humanos. A Comissão Interamericana está mandatada para promover a observância dos direitos humanos na região e atuar como órgão consultivo da OEA sobre o assunto. A CIDH é composta por sete membros independentes, eleitos pela Assembleia Geral da OEA em caráter pessoal, e não representam seus países de origem ou residência.
No. 252/23
3:00 PM