REDESCA publica relatório sobre as inundações no Rio Grande do Sul e formula recomendações

30 de abril de 2025

Impactos das inundações no Rio Grande do Sul: observações e recomendações para a garantia dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais

Contato de imprensa

Relatoria Especial para os Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais

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Washington, DC—A Relatoria Especial sobre Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (REDESCA) da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) publica o relatório "Impactos das inundações no Rio Grande do Sul: observações e recomendações para a garantia dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais". O documento apresenta observações e recomendações dirigidas ao Estado brasileiro, com base na visita de trabalho realizada entre os dias 2 e 6 de dezembro de 2024, após uma das maiores tragédias socioambientais da história recente do país.

Durante a missão, liderada pelo Relator Especial Javier Palummo Lantes, a equipe da REDESCA reuniu-se com autoridades, movimentos sociais, lideranças comunitárias, membros da comunidade científica e visitou comunidades diretamente afetadas pelas inundações. As atividades incluíram reuniões e visitas técnicas em Brasília, Porto Alegre, Eldorado do Sul e na região do Vale do Taquari, incluindo os municípios de Estrela e Lajeado. O principal objetivo foi documentar os impactos da tragédia sobre os direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais (DESCA), com ênfase especial na resposta emergencial, nas ações de mitigação, nos processos de reconstrução e nas estratégias de adaptação às mudanças climáticas.

A Relatoria Especial destaca que mais de 2,3 milhões de pessoas foram afetadas pelas inundações ocorridas entre abril e maio de 2024, que resultaram em 183 mortes confirmadas, 27 pessoas desaparecidas, cerca de 800 feridas e milhares de famílias deslocadas. O relatório evidencia a desproporcionalidade dos impactos sobre grupos em situação de maior vulnerabilidade, incluindo meninas e mulheres, pessoas afrodescendentes, povos indígenas e comunidades tradicionais, pessoas com deficiência, pessoas idosas, população LGBTQIA+, migrantes e refugiados, bem como trabalhadores e trabalhadoras rurais e informais.

A Relatoria Especial reconhece os esforços do Estado brasileiro na resposta à tragédia, entre eles a mobilização de recursos financeiros, a criação de estruturas de gestão da crise, a ampliação de programas sociais, o apoio a municípios em estado de calamidade e a implementação de ações coordenadas entre os níveis federal, estadual e municipal, em articulação com a sociedade civil e organismos internacionais. Destacam-se, em particular, as ações de resgate, a rapidez na organização da assistência humanitária, a reconstrução da infraestrutura e o apoio prestado à população afetada como elementos fundamentais para mitigar os danos imediatos da catástrofe.

Com base nas informações coletadas durante a visita e na análise dos dados disponíveis, o relatório identifica falhas estruturais que podem ter contribuído para a magnitude dos impactos sobre os DESCA, entre elas a degradação ambiental, a expansão do agronegócio, o enfraquecimento da legislação ambiental, a falta de manutenção dos sistemas de contenção de enchentes e o crescimento urbano com baixa resiliência ambiental.

Diante desse cenário, a REDESCA reafirma a urgência de que o Estado brasileiro consolide a justiça climática como princípio orientador de suas políticas públicas, fortalecendo as medidas de prevenção, adaptação e resposta a desastres com base nos direitos humanos. Isso implica reverter retrocessos em matéria ambiental, garantir o acesso a informações confiáveis e combater a desinformação, assegurar a participação efetiva das comunidades afetadas —incluindo a consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas e comunidades tradicionais— e adotar políticas inclusivas que reconheçam e enfrentem os impactos diferenciados sofridos por grupos historicamente marginalizados.

O relatório destaca os impactos da tragédia climática sobre trabalhadores e trabalhadoras de diversos setores, em especial aqueles em situação de informalidade, como pessoas que atuam na pesca artesanal, na coleta de materiais recicláveis, no trabalho por aplicativos e na produção artesanal, que enfrentaram perda de renda e ausência de proteção social. Também foram observados efeitos severos sobre comunidades rurais, povos indígenas e quilombolas, incluindo o aumento da insegurança alimentar. A REDESCA recomenda o avanço na titulação de territórios quilombolas, na reforma agrária e na demarcação de terras indígenas, ao mesmo tempo em que rejeita de forma categórica a tese do "marco temporal".

Outro aspecto crítico apontado pela REDESCA é a violação do direito humano à água, comprometido como consequência das inundações. O transbordamento de esgotos e a contaminação de fontes hídricas por substâncias químicas e biológicas — incluindo agrotóxicos — afetaram seriamente rios, lagos e aquíferos, gerando riscos significativos para a saúde pública. A Relatoria Especial alerta para as ameaças sanitárias decorrentes dessa situação e sublinha a urgência de adoção de medidas estruturais de resiliência e prevenção.

A Relatoria Especial destaca a urgência de implementar medidas estruturais para prevenir novos desastres no Rio Grande do Sul, fundamentadas nos princípios da justiça climática e dos direitos humanos. Entre as principais recomendações estão a modernização dos sistemas de monitoramento hidrológico e alerta precoce, o fortalecimento das infraestruturas de drenagem pluvial e de contenção de enchentes, bem como a revisão e efetiva implementação dos planos diretores e de gestão de riscos, assegurando uma participação social ampla e significativa. A Relatoria também propõe a adoção de Soluções Baseadas na Natureza (SbN), com a expansão de infraestruturas verdes — como parques urbanos, telhados verdes e corredores ecológicos — e azuis — como áreas úmidas, sistemas de drenagem natural e recuperação de margens de rios —, em articulação com a comunidade científica, autoridades locais e populações afetadas.

A REDESCA agradece ao Estado brasileiro por sua abertura e colaboração durante a visita de trabalho e no contexto deste relatório, reafirmando que eventos climáticos extremos, como os ocorridos no Rio Grande do Sul, são também reflexo de fragilidades sociais e institucionais que exigem respostas articuladas e baseadas nos direitos humanos. A Relatoria Especial destaca especialmente o apoio do Ministério das Relações Exteriores, da Missão Permanente do Brasil junto à Organização dos Estados Americanos (OEA), do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), da Defensoria Pública da União (DPU), do Ministério Público Federal (MPF) e de outros órgãos públicos, bem como a valiosa participação de organizações da sociedade civil e comunidades afetadas, cujas contribuições foram essenciais para este relatório.

A Relatoria Especial reconhece os esforços empreendidos pelo Estado brasileiro durante as inundações de 2024 e enfatiza que a garantia efetiva dos direitos humanos frente às mudanças climáticas requer o fortalecimento das medidas preventivas, da participação social e do compromisso com práticas sustentáveis e equitativas. Nesse sentido, a REDESCA reafirma seu compromisso com a promoção e proteção dos direitos humanos diante da emergência climática, e coloca-se à disposição para oferecer cooperação técnica, inclusive com a possível ativação de um mecanismo especial de acompanhamento, com o objetivo de monitorar e fortalecer as ações voltadas à proteção dos DESCA frente aos impactos das mudanças climáticas.

A Relatoria Especial sobre Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais é uma relatoria criada pela CIDH com o objetivo de fortalecer a promoção e proteção dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais no continente americano, liderando os esforços da Comissão nessa matéria.

No. RD084/25

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