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Comunicado de Imprensa

A CIDH e sua REDESCA manifestam profunda preocupação pelos efeitos da pandemia COVID-19 na Venezuela e chamam a garantir os direitos das pessoas venezuelanas na região

29 de março de 2020

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Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e sua Relatoria Especial sobre Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (REDESCA) no âmbito de sua recentemente instalada Sala de Coordenação e Resposta Oportuna e Integrada (SACROI – COVID-19), reconhecem a complexidade que os Estados e as sociedades em todo o mundo enfrentam devido às medidas excepcionais que procuram responder à pandemia ocasionada pelo coronavírus COVID-19, que avança de modo exponencial e que, em 26 de março, ja havia cobrado ao menos 21.031 vidas em nível global e 1.330 no hemisfério ocidental. Isto supõe desafios extraordinários desde o ponto de vista dos sistemas sanitários, da vida cotidiana das pessoas e inclusive para a vigência dos direitos humanos. Nesse contexto, a CIDH e sua REDESCA alertam com grave preocupação para os efeitos da pandemia em face da situação de extrema vulnerabilidade das pessoas venezuelanas, devido à profunda e prolongada crise humanitária pela qual atravessa o país.

A pandemia do COVID-19 demanda uma atitude responsável e solidária por parte de todos os Estados, instituições nacionais e internacionais, bem como da cidadania em geral. A Comissão e sua REDESCA têm observado como a grave situação de direitos humanos que afeta as venezuelanas e os venezuelanos nos últimos anos tem se aprofundado devido à crise humanitária, que tem gerado a maior crise de deslocamento das Américas, e que levou cerca de 5 milhões de pessoas venezuelanas a se deslocarem. Nesse contexto complexo, as autoridades da Venezuela têm a obrigação de adotar sérias e exaustivas medidas de atenção e de contenção do COVID-19; por sua vez, os países de acolhimento devem redobrar esforços para garantir o direito à saúde das pessoas e mitigar os efeitos de um potencial contágio massivo.

Com efeito, através do seu constantes monitoramentos sobre a situação de direitos humanos, e sua recente visita in loco à fronteira entre Colômbia e Venezuela, a CIDH e sua REDESCA puderam verificar que a Venezuela atravessa uma crise humanitária sem precedentes. Isto repercutiu profundamente no gozo dos direitos humanos, especialmente nos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais (DESCA) de grande parte da população; particularmente daqueles coletivos em situação de vulnerabilidade, discriminação ou exclusão histórica. Nesse sentido, a Comissão e sua REDESCA recordam o caráter interdependente e indivisível de todos os direitos humanos, bem como a interseccionalidade dos seus efeitos, o que, como se tem sustentado, se observa com particular clareza no caso venezuelano.

Quanto às condições para uma adequada atenção à saúde, a CIDH e sua REDESCA vêm reiteradamente alertando sobre a deterioração progressiva da rede hospitalar na Venezuela, cujos centros médicos contam, em geral, com infraestrutura inadequada e escassez de suprimentos básicos, bem como de pessoal médico qualificado. Grande parte dos centros de saúde da Venezuela não contam de forma contínua com água potável, eletricidade, material de higiene e profilaxia, equipes cirúrgicas, laboratórios para controles de transfusões sanguíneas, material para esterilizar os instrumentos, vacinas para imunizações básicas, elevadores operacionais, nem meios de contraste para realizar diagnósticos. A isto se soma um clima de perseguição e assédio contra as e os profissionais da saúde, e das pessoas que protestam pela falta de equipamentos e de suprimentos para oferecer uma atenção de qualidade às pessoas enfermas. Particularmente, a Comissão e sua REDESCA receberam informações sobre a situação crítica do Hospital José Manuel de los Ríos, o maior centro pediátrico do país, e do Hospital Maternidade Conceição Palacios, um dos principais centros de atenção obstétrica em nível nacional. Ambos os hospitais foram beneficiados com medidas cautelares concedidas pela CIDH, que até a presente data não foram cumpridas pelo Estado.

A situação das pessoas na Venezuela é agravada pela insuficiência de alimentos em qualidade e quantidade suficiente , pela baixa remuneração salarial e pela hiperinflação, assim como pela suspensão generalizada e frequente de serviços públicos como o de fornecimento de água potável, de gás natural ou de energia elétrica. A confluência desses fatores no contexto de uma pandemia leva a que as pessoas estejam impossibilitadas de tomar medidas necessárias essenciais de profilaxia e de prevenção, como lavar frequentemente as mãos com água e sabão ou o isolamento em suas casas, o que aumenta o risco de contato com o vírus e de contágio.

Diante desse panorama, a Comissão e sua REDESCA fazem um chamamento enérgico para que as autoridades da Venezuela adotem medidas dirigidas a garantir o direito à saúde de todas as pessoas idosas e de outros grupos especialmente afetados pelo COVID-19, com perspectiva de igualdade de gênero. Para tanto, é indispensável que se produza informação veraz e transparente, sem que haja restrições indevidas no acesso à informação relacionada com a pandemia e as ações de contenção. Em acréscimo, advertem de maneira enfática que a perseguição, intimidação e assédio a profissionais da saúde que denunciam a falta de equipamentos e a má administração epidemiológica da crise, não somente são incompatíveis com os objetivos de administração de uma crise sanitária por parte do Estado, mas são também manifestamente contrários às suas obrigações internacionais em matéria de direitos humanos.

Em acréscimo, a CIDH, por intermédio de sua Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão (RELE), teve notícias de que, no dia 21 de março, o jornalista Darvinson Rojas teria sido detido junto aos seus pais pelas Forças de Ações Especiais (FAES), sem ordem de prisão, supostamente para se realizar um teste de COVID-19, logo após o jornalista ter publicado na rede social Twitter estatísticas do COVID-19 no estado de Miranda. A Comissão e sua RELE recordam que o jornalismo cumpre uma função crucial no contexto da pandemia, ao difundir informações vitais e monitorar ações dos Estados; e que as pessoas jornalistas não devem ser detidas ou acusadas por informarem ou questionarem dados oficiais.

Por outro lado, a CIDH e sua REDESCA tomam nota das medidas adotadas pelas autoridades venezuelanas, segundo anúncio público do dia 22 de março, entre as quais se encontram: a suspensão dos pagamentos de aluguel de imóveis por seis meses em todo o país; a suspensão da moratória dos juros de alguns empréstimos, incluindo a moratória geral da carteira comercial dos bancos; e a proibição de suspensão de serviços de telecomunicações e de serviços públicos por 6 meses. A CIDH e sua REDESCA chamam o Estado para que essas e outras medidas de caráter econômico e social que se adotem sejam aplicadas de maneira equitativa e em acordo aos parâmetros internacionais de direitos humanos, levando em conta as diferentes realidades e necessidades da população venezuelana, sem que em nenhum caso sejam utilizadas como mecanismos de coerção ou discriminação política nem de qualquer outra índole.

Nesse sentido, a CIDH e sua REDESCA destacam a declaração da Alta Comissionada das Nacões Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, formulada em 24 de março passado, pedindo que as sanções setoriais de amplo espectro que são aplicadas aos países que enfrentam a pandemia do COVID-19 sejam objeto de uma reavaliação urgente em função de sua possível repercussão negativa sobre o setor da saúde e dos direitos humanos.

Situação das pessoas venezuelanas em migração forçada na região

Em seu comunicado de imprensa No. 60/20, a Comissão já se pronunciou sobre a natureza complexa da emergência epidemiológica global atual e sobre a necessidade de que os Estados sigam os parâmetros mais elevados de proteção integral dos direitos humanos em suas respostas. Nesse contexto, a CIDH, em conjunto com suas relatorias especiais, ressalta que o fenômeno venezuelano de migração forçada reforça a necessidade de ações coordenadas, cooperação internacional e intercâmbio de informações e boas práticas pondo no centro das ações a integralidade dos direitos humanos.

Em termos gerais, a Comissão destaca que a pandemia do COVID-19 não pode ser utilizada como desculpa para que os Estados não cumpram com as suas obrigações de direito interno e internacional em relação às populações que necessitam de proteção especial. Nesse sentido, a CIDH observa com grande preocupação os impactos desproporcionais produzidos sobre as pessoas venezuelanas migrantes, refugiadas e com necessidades de proteção internacional geradas pelas medidas dirigidas à contenção do COVID-19 nos principais países de acolhimento e de trânsito na região. A Comissão reconhece a necessidade em se adotar medidas para prevenir a propagação do COVID-19, não obstante, alerta que tais medidas não devem se mesclar com políticas e mecanismos migratórios que resultem na ruptura do princípio de não devolução (non-refoulement) ou obstacularizem o acesso aos adequados instrumentos de proteção.

A CIDH reconhece também que a crise epidemiológica pode se constituir em um fator de deslocamento forçado. Com efeito, o aprofundamento da pandemia do COVID-19 pode conduzir a novos fluxos migratórios na região, particularmente entre os grupos sociais com rede de proteção social mais fraca. Tal fenômeno exige que os Estados estejam preparados para incorporar em seus mecanismos de resposta novas capacidades de acolhimento. No caso das pessoas migrantes, refugiadas e com necessidades especiais de proteção internacional provenientes da Venezuela, a pandemia tem o potencial de reforçar os fatores de deslocamento já existentes, como a procura por atendimento em saúde. Desde o ponto de vista da proteção integral dos direitos humanos, a CIDH e sua REDESCA fazem um chamamento urgente aos países da região para que cumpram com suas obrigações em matéria de asilo e refúgio, e que ofereçam medidas de atenção e tratamento de saúde sem nenhum tipo de discriminação. Recordam também que toda pessoa, independentemente da sua situação migratória ou da sua origem, tem direito a receber a mesma atenção médica que os nacionais do país de trânsito ou acolhimento.

A Comissão e sua REDESCA observam com preocupação que, em vários países de acolhimento de migrantes, estão sendo adotadas medidas voltadas ao fechamento parcial ou total de fronteiras com a Venezuela, intensificação de operativos migratórios e diminuição da capacidade nos serviços de atenção e distribuição de documentos. Por exemplo, recebeu-se informações sobre restrições ao direito de circulação adotadas nos dois lados da fronteira entre Venezuela e Colômbia, incluindo o fechamento geral da fronteira do lado colombiano e a abertura de um corredor humanitário para pessoas que requerem atendimento médico. Nesse contexto, a CIDH e sua REDESCA reiteram que é necessário que se garanta o acesso à saúde das pessoas venezuelanas com enfermidades crônicas e que se faça uma avaliação do impacto das medidas que restringem a circulação fronteiriça sobre as milhares de pessoas venezuelanas e colombo-venezuelanas que diariamente cruzavam à Colômbia para se alimentarem.

Do mesmo modo, a Comissão e sua REDESCA consideram urgente que os Estados incorporem em seus programas e planos de prevenção e assistência as necessidades de emergência das cerca de 5 milhões de pessoas venezuelanas fora do seu território, entre outros milhões de pessoas refugiadas e deslocadas na região, que serão especialmente afetadas pela crise epidemiológica. Nesse sentido, a Comissionada Esmeralda Arosemena de Troitiño, Relatora para a Venezuela, expressou sua profunda preocupação pela vida, saúde e integridade das venezuelanas e venezuelanos tanto dentro como fora do país, e fez um chamado à solidariedade regional para lhes oferecer a assistência humanitária e a proteção internacional que requerem.

A REDESCA é um Escritório da CIDH, especialmente criado para apoiar a Comissão no cumprimento de seu mandato de promover e proteger os direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais nas Américas.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

No. 064/20